Muito tem se falado sobre comportamentos nocivos do homem em relação às mulheres, à sociedade e até em relação a eles mesmos. E as consequências destes comportamentos são tão graves, que se criou o termo “masculinidade tóxica” para categorizá-las. A expressão foi eleita a mais relevante de 2018, pelo dicionário Oxford, por ter sido a que mais atraiu buscas na internet durante o ano.
De acordo com centenas de artigos publicados, a “masculinidade tóxica é uma descrição estreita e repressiva da masculinidade que a designa como definida por violência, sexo, status e agressão, é o ideal cultural da masculinidade, onde a força é tudo, enquanto as emoções são uma fraqueza; alguns dos efeitos da masculinidade tóxica são a supressão de sentimentos, encorajamento da violência, falta de incentivo em procurar ajuda, até coisas extremamente graves, como encorajamento ao estupro, homofobia, misoginia e racismo”.
Atualmente, pega muito mal pra nós, colegas do bem, homens contemporâneos, defensores da igualdade de gênero etc, sermos associados a comportamentos tão destrutivos, que não têm nada a ver com nossa filosofia de vida. Mas, será mesmo que não têm?
Podemos não estar ostentando olhos roxos por aí, ou truculências por onde passamos, podemos respeitar as mulheres, convivermos numa boa com a ideia de rachar a conta no motel, de cozinhar divinamente ou de fazer tricô entre velhinhas, como o mito Rodrigo Hilbert demonstrou que é ótimo fazer. Mas será que essa masculinidade tóxica não está tão arraigada a nós que nem percebemos quando está presente?
Dados recentes demonstram que sim, refletimos diariamente o fardo da masculinidade tóxica. O mais óbvio disso é a triste constatação de que morremos em média 7 anos mais cedo do que as mulheres. Acaso? Determinação fisiológica? Destino? Nada disso, estudos comprovam que é por conta das simples consequências de nossas ações, ou melhor, omissões. Isso porque homens simplesmente não procuram ajuda médica, não se cuidam o suficiente para terem uma boa saúde.
Achamos que nunca vamos adoecer, fazemos o diagnóstico tardio de doenças graves, não seguimos o tratamento recomendado. Também estamos mais expostos aos acidentes de trabalho e trânsito, utilizamos álcool e drogas em maior quantidade, nos envolvemos mais em situações de violência e não praticamos atividade física com regularidade. Tudo que envolve o autocuidado, em resumo, nós negligenciamos.
Pesquisas recentes, realizadas nos Estados Unidos (onde homens também se consultam menos do que as mulheres), indicam que outro elemento está por trás dessa diferença na estimativa do tempo de vida dos homens é o fator cultural que associa ao sexo masculino características como “bravura” e “autossuficiência”. Educados para se mostrarem fortes, homens evitam o atendimento médico por receio de serem considerados fracos, disse à BBC Brasil uma das autoras desses estudos, Mary Himmelstein, pesquisadora da Universidade de Connecticut.
Os entrevistados também deram informações pessoais sobre com que frequência iam ao médico e quanto tempo costumavam demorar para se consultarem quando se sentiam mal. Cruzando esses dados, os pesquisadores concluíram que, quanto mais os entrevistados se identificavam com valores associados culturalmente à masculinidade – bravura e autossuficiência, mais tendiam a minimizar problemas de saúde e a evitar consultas médicas. Os resultados também mostraram que, apesar de escolher médicos homens, eles têm mais dificuldade em falar abertamente com os profissionais, provavelmente pelo receio de parecerem vulneráveis à frente de alguém do mesmo sexo. A masculinidade tóxica também está associada com a frequência menor de cuidados gerais com a saúde, como ir ao dentista, fazer exames de rotina, usar protetor solar, adotar uma alimentação saudável, etc. Além disso, quando se machucam ou sentem algum desconforto físico ou emocional, os homens tendem a ser menos honestos sobre os sintomas que estão sentindo. É o famoso “não foi nada”, que usamos para não soarmos frágeis!
Não adianta sermos tão cientes quanto aos problemas da masculinidade tóxica, se não tomamos providências para acabar de vez com ela. São sete anos de experiências, memórias e aprendizados que colocamos a perder em função destes condicionamentos destrutivos. Por isso, amigos intoxicados, vamos nos tocar de que não somos imortais, que somos sim vulneráveis e precisamos de cuidados. Procurar ajuda profissional não nos torna menos homens; só nos torna menos propensos a engrossar a estatística triste de certidões de óbito precoces.
E você, parceiro, quando foi ao médico pela última vez? Bora agendar uma consulta?