Drogas psicotrópicas, ou psicoativas, compõem uma longa lista de substâncias legais e ilegais que afetam a maneira como o cérebro funciona, seja em um esforço para tratar uma doença mental de algum tipo ou para fins recreativos ilícitos. Entre elas, estão os antidepressivos, estimulantes, remédios para o sono e ansiolíticos.
O que se vê e é alarmante é o uso destas drogas por uma grande parcela da população. Cogita-se se não estão sendo equivocadamente diagnosticadas com transtornos psiquiátricos ou se automedicando. Na opinião do Dr Pablo Vinicius, especialista em Psiquiatria e em Medicina do Sono, “as pessoas estão abusando dos psicotrópicos para conseguirem conviver com suas vidas medíocres”.
Assim, rotina desgastante, falta de motivação, sentimentos de angústia e apatia, impotência perante os desafios diários, entre outras situações, seriam condições predisponentes ao uso dessas drogas. Será que precisamos mesmo tanto deles, ou estaríamos apenas tentando nos anestesiar?
As drogas psicotrópicas surgem como uma resposta rápida e aparentemente eficiente para lidar com muitas questões da atualidade. Entretanto, apesar de as reais indicações para seu uso serem limitadas e pontuais, o que se constata é um alto número de pessoas que se automedicam ou recebem prescrições desnecessárias.
Isso ocorre porque partir da década de 90, a prescrição de drogas psicotrópicas tornou-se um negócio em expansão, arrecadando muitos bilhões de dólares a cada ano e pagando bilhões para influenciar os médicos a prescrever, mesmo sem haver clara indicação. Atualmente, estima-se que o “mercado global de drogas depressivas” (incluindo apenas a maior classe de muitos psicotrópicos) chegará a US $ 16,8 bilhões em 2020, em comparação a US $ 14,51 bilhões em 2014. Será que estamos mesmo ficando cada vez mais doentes?
Segundo o psicanalista Contardo Calligaris, “o sucesso dos antidepressivos na década de 1990 não foi fruto de nenhum triunfo da ciência. Antes, é a consequência da nova atitude cultural: queremos que nosso sofrimento psíquico deixe de ser um drama subjetivo e passe a ser visto e vivido como um problema médico. Aos antidepressivos é pedido que tratem nosso mal-estar como uma disfunção do corpo, posição que leva a um assujeitamento, ou seja, o sujeito se retira de seu sofrimento, que passa a ser um mero distúrbio neurofisiológico. Instala-se a passividade: a pessoa não se vê como protagonista do seu adoecimento. Há como que a desistência da dura tarefa de mudar”.
Talvez, “medicalizar” nossos problemas psíquicos nos deixe à mercê de coisas que estariam além de nosso alcance. Tornamo-nos passivos e entregamos nossas neuroses para a indústria farmacêutica tratar, nos ausentando da responsabilidade de encará-las a fundo e trabalhar para que nos curemos.
Dr Gøtzsche, chefe de um centro de pesquisa da Cochrane (uma organização mundial reconhecida por seu compromisso com as evidências científicas, “padrão-ouro” na pesquisa) é contra o uso da maioria das drogas psicoativas. Segundo ele, “as drogas psiquiátricas são responsáveis pela morte de mais de meio milhão de pessoas com 65 anos ou mais a cada ano no mundo ocidental. Efeitos graves como o suicídio, segundo ele, são subnotificados pela indústria farmacêutica. Seus benefícios precisariam ser colossais para justificar isso, mas são mínimos”, justifica.
As consequências do mau uso destas medicações ultrapassam a questão das reações adversas. Elas transcendem para um universo em que questões psíquicas, que deveriam ser trabalhadas em terapia, com mudanças de comportamento, “de dentro para fora”, são tratadas de modo paliativo, com o foco nos sintomas, sem atuarem diretamente sobre as causas do problema.
Por exemplo, alguém que resolve por conta própria tomar medicação para dormir, sem cuidar paralelamente de sua saúde mental (para descobrir e tentar lidar positivamente com o que está lhe tirando o sono), está não só comprometendo sua saúde, como também criando dependência psicológica da medicação. Dificilmente, essa pessoa vai resolver o problema apenas com comprimidos, o mais provável é que o empurre pra debaixo do tapete, onde ficará latente.
Buscar por ajuda profissional é crucial, quando de fato houver necessidade, bem como recorrer aos fármacos, em caso de patologias psiquiátricas. No entanto, é importante estar ciente dos seus riscos e efeitos indesejados que produzem no organismo. É preciso estar aberto a formas alternativas de lidar com o sofrimento psíquico, seja por meio de terapias, remédios naturais, mudança de estilo de vida, técnicas de relaxamento, meditação, medicina chinesa, ou quaisquer outras abordagens que não acarretem em tantos prejuízos à saúde e que não nos anestesiem de questões que precisamos encarar e tratar para ter saúde mental.